“Povo negro unido/ é povo negro forte,/ que não teme a luta,/ que não teme a morte”, bradava uma moquequinha de gente espremida por policiais num auditório.
UM DIA SE VERÁ que um dos piores males da chegada do petismo ao centro do poder na recente década foi ter transformado os movimentos sociais em mera correia de transmissão dos interesses materiais dos seus ideólogos. Esperemos isso neste domingo, 15, quando das manifestações nacionais do “Fora, Dilma!”. [clique para saber]
Dentre os movimento sociais organizados, talvez seja o Movimento Negro (MN) o que mais se deixou prejudicar pelo canto de sereia da ortodoxia ditada por aqueles ideólogos. Aliás, nenhum deles negro ou sequer compromissado na compreensão do racismo que estrutura a sociedade brasileira.
Decorre da submissão ao “esquerdismo” governamental – entre aspas, porque grande parte é apenas aparência – o fato da baixa intensidade dos protestos contra a sistemática matança, na Bahia e alhures, de jovens negros vitimados seja por ações da Polícia seja pela disputa do tráfico ilícito de drogas e armas.
Ações que estão umbilicalmente embricadas. Nas quais o negro entra somente como vítima-algoz. Vez que não faz parte da cadeia de comando nem de uma coisa nem de outra.
A liderança do MN, crente de sua opção “esquerdista” – mesmo que pouco entenda o que isso hoje signifique – vê-se compromissada com essa esquerda fajuta. Diante dos tenebrosos fatos que engolfam os líderes partidários que seguem, ao menos na Bahia, vê-se também envergonhada.
É ESSE “COMPROMISSO”, no fundo similiar ao que o escravo tem com o seu senhor, que deprime, torna obesas e envelhecidas, na aparência e no verbo, tantas possíveis lideranças sociais, hoje abortadas e cumprindo tarefas para seus chefetes.
Negros devem restringir suas iniciativas políticas estritamente a questões de sua “especificidade”, identidade etc. Ir às ruas? Somente no 20 de Novembro (transformado em Carnaval) e para assuntos do seu próprio umbigo.
É aquele “compromisso” que dá liberdade para os novos donos do poder na Bahia tripudiarem não apenas sobre a pilha de cadáveres semanais que faz de Salvador uma cidade ensanguentada.
Eles, por falta de uma imprensa forte e independente, por contarem com a cooptação da Universidade, vêem como normal o assalto que praticam ou deixam praticar contra a bolsa pública, a violência da omissão, das regalias, das desigualdades que disseram iriam combater.
Por ter abdicado de cumprir o dever de denúncia dos desmandos praticados em benefício, pessoal ou de grupo, dos seus caciques de partidos e correntes, a liderança do MN obedece a um limite de crítica ao status quo.
Não radicaliza nem vai às ruas porque seu novo nhônhô aí está porque para ele fez campanha, votou (mesmo se nulo), elegeu, reelegeu e quer que continue. Por temer ou a patrulha da cartilha dos ideólogos, ou a perda do pouco que lhe foi cedido nesse governo. Não rompe, mantém no poder os que dão prosseguimento ao massacre de sempre.
O AMBIENTE em recente ato, na sede local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), lembrou-nos, a menos a mim que também lá estive, os piores tempos que presenciei na luta contra o final da última ditadura militar no país.
Estimulados pelo discurso do governador Rui Costa dias antes, em que incentivava os seus PMs a matar supostos criminosos como artilheiros fazem gol, auditório e dependências da OAB foram tomados por centenas de agentes policiais. Muitos, secretos, os mais exaltados. Ali estavam, sob a chancela sindical, para provocar os organizadores do evento. Um carro de som na entrada do prédio emitia palavras de ordem na mesma linha da fala do governador.
Governador que, como é de se esperar, adota dois pesos e duas medidas para suspeitos de crimes. Miseráveis pés de chinelo envolvidos em crimes, ele deu ordem, podem ser sumariamente exterminados. Quanto a gente sua, são outros milhões e quinhentos…
Seu vice, João Leão(PP), incluso na lista do Supremo Tribunal Federal como suspeito de embolsar ilicitamente parte dos bilhões de dólares desviados da Petrobras [clique para ler], assim como outro aliado, Mário Negromonte (PP), que o ex-governador Jacques Wagner (PT) fez conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios, esses “são inocentes até prova em contrário” – como Rui e Wagner se apressam em defender.
Por sinal, será interessante verificar, dessa vez, como o petismo agirá em relação ao ministro do STF, Teori Zavascki, relator e responsável pela lista do chamado Petrolão. Ele não é negro nem se chama Benedito Barbosa, nem Joaquim. Parece que agora não pode usar a militância negra organizada como capataz da insidiosa campanha de desqualificação desse. [clique para ler]
Voltando ao ato. Convocado pela campanha “Reaja ou será morto/Reaja ou será morta” [clique para ler] para discutir formas de encaminhando de busca de soluções legais para o esclarecimento sobre a execução de 12 jovens, em uma única abordagem da Rondesp (Rondas Especiais da PM baiana), na madrugada de 6 de fevereiro [clique pra ler]. O ato apenas não desembocou em quebra-quebra em razão da seriedade de quem o organizou.
O “PETISMO” VAI além do PT e suas facções internas. Incluiu o amplo espectro das forças que aderiram ao projeto político traçado por gente como José Dirceu e Lula. Projeto que a cada dia, pelos dados e fatos disponíveis, revela-se mais neoconservador. Mesmo que a propaganda queira nos engolir o rótulo ou de “progressista” ou de “esquerda”.
Direitistas de quatro costados, das elites capitalistas, compõem o governo. O arco inclui economistas ideólogos como Bresser Pereira e Delfim Neto, da época da estrotosférica inflação de três dígitos no Brasil. O que comprova que para o projeto de poder petista, uma determinada direita é bem-vinda, desde que do nosso lado.
De grandes grupos empresariais nacionais e transnacionais. De empreiteiras ao setor financeiro. A ultraconservadores representantes do Brasil arcaico – vale Kátia Abreu, Paulo Maluf, Fernando Collor de Mello, José Sarney… Não servem apenas siglas que se nomeiam “socialistas”, “comunistas” e outros istas.
NA BAHIA, MAIOR ESTADO negro do país, a matança de negros segue inalterada, num continuum.
Ex-carlistas são hoje os principais sócios do poder petista e deste goza as mais reverenciais regalias. Ainda agora a cúpula de poder, mergulhada em escândalos de corrupção e à justa insatisfação de setores da sociedade aos desmandos governamentais, atribui tudo a “uma tentativa de golpe direitista”.
Como se os direitistas estivessem somente do lado de cá, ou como se fosse proibido ir às ruas protestar como sempre fizemos. Quer dizer, quando o PT mobilizou sua militância contra a lei de responsabilidade fiscal, contra o Plano Real, contra Collor, contra o colégio eleitoral que derrotou o candidato à presidência da ditadura militar, isso era em defesa da democracia.
Quando por toda a década de 1990 e começo dos anos 2000 a militância negra do petismo, ditada por aqueles mesmos ideólogos, resistia à proposta de adoção de políticas de ação afirmativa, isso foi em nome de “causas maiores”.
Sempre soubemos, eu e uma moquequinha de outros que levamos porrada da policia na luta por cotas para negros nas universidades. [clique para ler]
Mauro disse:
O tal do movimento negro brasileiro é uma piada de mau gosto. Somos 53% da população brasileira (proporcionalmente, 4 vezes mais do que os negros norte-americanos!) e mal conseguimos eleger um vereador aqui, outro ali. Na última eleição, a quantidade de negros eleitos diminuiu, ao invés de aumentar.
Em 2013, viu-se de tudo nas ruas durantes os protestos, desde black blocs até defensores dos cães beagles. Só não tivemos notícia do “movimento negro”…
Reuniões, seminários e simpósios fazem as vezes de passeatas, protestos e manifestações à céu aberto.
Em São Paulo, segundo a lenda, a última grande ação do movimento que não se realizou dentro de quatro paredes ocorreu em 1978…
No final do século XIX, a participação dos afrobrasileiros na vida política e cultural do país era maior do que é hoje!
O negro brasileiro não deu certo.
Romenil Silva disse:
Sr. Mauro, ótimo seu comentário.Aliás, em tempos de polícia federal em todo território nacional, seja na tv, jornais, ou em qualquer mídia social, não se ver nenhum policial federal NEGRO!Por que?O que se nota, são rapazes e moças(pela aparência, na faixa etária trinta e poucos anos a cinquenta e poucos anos).Preto só a farda com letras amarelas.Ah! vai aparecer algum idiota, afirmando que a culpa é dos editores de imagens…
Fabio Nogueira disse:
Imbecil por falta de argumento e conhecimento fala qualquer boçalidade. Vai estudar história,senhor Mauro. História tem o poder de curar ignorância .
chico bezerra disse:
A culpa é nossa, que ficamos quietos, educadinhos alimentando o medo. Não vamos mais às ruas, praças, igrejas, escolas e aos estádios de futebol, para protestar pelas
mortes, chacinas e execuções dos nossos, Estamos vivendo e tremendo de medo das polícias, em particular a militar, que é o instrumento legal do Estado Genocída ,que tem como finalidade executar os jovens pretos, pobres das periferias, das capi-tais e das cidades brasileiras. Ficamos calados, quando somos abordados por poli-ciais de forma desrespeitosa, e mais calados ainda, quando sabemos que aquele que está nos abordando, tem dois, três ou mais homicídios em sua folha corrida. Vai ficar pior ainda, esse congresso conservador, vai facilitar dezenas de leis fascista. Tenho certeza, que está próximo o dia, a NOITE DE SÃO BARTOLOMEU
Everson disse:
Nossa falha é a intelectualizacao, o movimento deveria entender que a massa negra precisa ser ouvida, sem soberba para não intimidar. Fazer o negro pobre votar em outro negro, é trabalho árduo de conscientização que a mídia branca doutrina com a inversão de nossos valores. Esquerda ou direita são conceitos não entendido por quem só quer um lugar ao sol. A necessidade de reorganização ou, se transformar em partido político é a solução, pois senão, será sempre manipulado pelos que estiverem no poder.
Rafael Aquino disse:
É absurdo a segunda nação negra do “mundo” não possuir uma representação legítima nos legislativos, quem pauta as discussões sobre racismo e em relação ao caso do genocídio são parlamentares que nunca sequer sofreram racismo na vida, que sobem nas vilas e aglomerados apenas pra pedir voto no período eleitoral, esses senhores não nos representam. Nenhum partido político considera nossa causa como prioritária, o racismo e a luta pelo protagonismo da população negra deve ser diário, ao invés de limitar-se apenas ao dia 20 do mês de novembro.
Laura disse:
Acho um absurdo não saber ler o censo até hoje. Negros são 8% apenas e Pardos significa qualquer mistura, incluindo Indigena-Branca que forma uma grande parte do Norte e centro do Brasil. Brasil nação negra só em sonho e para quem joga qualquer mistura nos pardos, incluindo a Japonesa e Indigena.
Thiago Ribeiro disse:
Rafael, o movimento negro fracassou, falhou e acabou.
Quanto à representatividade, estamos trabalhando nisso. Em breve você terá notícias de um novo movimento negro. Um movimento real e sem ideias medievais. Abraços!
La disse:
Bom texto