Nesses dias recebi mensagem de Isabela Santos de Almeida, do Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia:

“Escrevo para dizer que a pesquisa com os textos teatrais censurados continua avançando e desta vez, estou desenvolvendo o projeto intitulado “O teatro amador nas periferias de Salvador”, em estágio de pós-doutorado na Uneb. Meu propósito é estudar a dramaturgia produzida pelos grupos periféricos de teatro amador durante a ditadura, contexto em que desponta o Grupo de Teatro do Calabar. Quando conversamos em 2016 , no Instituto de Letras, junto com a Profa. Rosa, o sr. trouxe alguns elementos para a reconfiguração dessa cena e eu iniciei as leituras discutindo o texto “A negra resistência”, em um artigo que está no prelo (veja no anexo). Gostaria de saber se o sr. teria interesse em conversar mais sobre o tema ou se teria materiais referentes ao grupo (recortes de jornais, diferentes versões dos textos teatrais, fotografias, cartazes etc). Como estudamos o processo de produção, circulação e recepção dos textos, numa perspectiva sócio-histórica, tudo o que for a eles relativos nos interessa. Profa. Dra. Isabela Santos de Almeida, do Instituto de Letras/UFBA.

Respondi que conversar poderia. Quanto aos materiais solicitados para ajudar em sua pesquisa, longe de casa estou sem condições de socorrer a colega. Alguma alma nobre por aí?

Calabar tempos atrás. Eu vim daí…

Primeiramente encenada em comunidades, “A Negra Resistência” estreou nos palcos de Salvador em 1985. Trata do levante antiescravagista liderado pelos malês, negros sudaneses, na Bahia exatamente 150 anos antes, em janeiro de 1835.

Para produzir o texto este escrevinhador ralou a bunda meses a fio nas cadeiras do Arquivo Público da Bahia, na Baixa de Quintas, onde os anais da devassa, processos judiciais e sentenças dos condenados encontravam-se já deteriorando-se.

As elites brancas de mando, sempre elas, consideraram provavelmente o mais temerário movimento de subversão da ordem vigente no Brasil. Repercutiu em todo o país, provocando debates inflamados nos parlamentos locais e da capital do Império, Rio de Janeiro.

Deputados e Senadores de diversas correntes políticas, em pânico, produziram a partir dali todo um conjunto de leis mais repressivas à presença de negros e negras nos espaços públicos, restringindo sua circulação por todo o território pátrio.

Professora Isabela Almeida examina criticamente o texto de “A Negra Resistência” em seu artigo. Clique aqui e leia.

O assunto foi tema do historiador João José Reis, que deve ter assistido a encenação do Grupo de Teatro do Calabar, lançando anos seguintes a obra que projetou sua carreira, Rebelião Escrava no Brasil: A Historia do Levante dos Males em 1835, fortemente embasada naqueles anais.

Talvez alguém mais, acessando este post, possa colaborar com o pós-doc da professora Isabela Almeida. Em arquivos de jornais baianos e também no acervo da hemeroteca da Biblioteca Comunitária do Calabar, recentemente organizada em projeto de uma equipe de História da UFBA com o Centro de Estudos e Ação Social (Ceas), é provável que se encontre o que ela precisa.

Como “A Negra Resistência” foi também encenada no Teatro do Icba, Corredor da Vitória, assim como na Sala do Coro do TCA e, se não falha a memória, no Teatro Miguel Santana, no acervo dessas instituições talvez subsista alguma coisa.