
Eric Adams, 61, deve ser o segundo prefeito negro eleito na história da cidade de Nova York. O primeiro foi há 32 anos. “Eu sou você”, é seu slogan aos eleitores, citando sua própria vida.
Nesse “Novembro Negro” no Brasil, onde a negrada militante satisfaz-se como puxa-saco de sinhá e de sinhô, late-mas-não-morde se ganha um ossinho, perguntar ofenderia?
Quando teremos aí o mesmo que Nova York em cidades-chaves como Rio de Janeiro, Salvador, Belo Horizonte, Recife, Porto Alegre, São Luís, Distrito Federal, São Paulo que, de toda forma, já deu Celso Pita, sob bênção de Paulo Maluf?
Ex-policial da polícia da cidade de Nova York (NYPD), na qual aposentou-se com patente de capitão, Adams assume a prefeitura a partir de janeiro de 2022 para um mandato de quatro anos.
A 2 de novembro os eleitores decidem pelo voto entre ele, do Partido Democrata, o mesmo do atual prefeito Bill de Blasio, e o candidato do Partido Republicano, Curtis Sliwa, com pouquíssima chance: o número de eleitores novaiorquinos alinhados aos democratas bate por 7 a 1 os republicanos.
Ele tem dislexia e fala disso aos eleitores, simpáticos à causa de deficientes. Diagnosticado diabético há cinco anos, tornou-se vegano. Notável em um país de dieta mortífera consumida por negros. Diz que vai promover uma dieta saudável, natureba, nos estabelecimentos públicos, particularmente na merenda escolar gratuita.
Tem uma história de vida dúbia, com episódios e fatos difíceis de serem checados, porque sem testemunhas. Qual seu verdadeiro endereço residencial, Nova York ou Fort Lee, no vizinho estado de Nova Jersey? Há assuntos com várias versões dadas por ele mesmo, como a de um “atentado” que sofreu a tiros dentro da viatura na qual se encontrava sozinho patrulhando uma rua.
Engajou-se na política dentro da corporação, criando um grupo – “100 Blacks in Law Enforcement Who Care” – de policiais negros com propósitos benfeitores. Concorreu a cargos públicos, foi eleito Senador estadual e é reconhecidamente um articulador que sabe fazer amigos entre as amizades políticas.
- FÁCIL VENCER, O PIOR ESTÁ POR VIR
Metrópole que mais atenção atrai no mundo, com mais de 8 milhões de habitantes e imigrantes de 150 nacionalidades, New York City será governada por um político nascido em zona pobre do Queens. Terá um orçamento em torno de $73 bilhões de dólares/ano.
Criado sem pai, por mãe solteira, que tinha de dar duro para criar os filhos, deixando-os à mercê. Aos 15 anos, junto com um irmão mais velho foi em cana por invadir a casa de uma prostituta.
Segundo sua versão para pegar uma quantia em dinheiro que a moça (“uma go-go girl“) lhes devia, por serviços de recados que faziam entre ela e os clientes.
A dura experiência com os policiais que o prenderam, contou ao The New York Times em recente reportagem principal de capa e duas páginas internas, o fez desejar entrar para a polícia, visando agir de outra forma.
Vencer as eleições será a parte mais fácil, afirma editorial do mesmo jornal a 48 horas do pleito. “Seu real desafio vem em janeiro, quando o novo prefeito terá de enfrentar os problemas de uma cidade marcada pela pandemia” do Covid-19.
Sem simpatia unânime do partido – o próprio De Blasio não o apoiou nas primárias vencidas por ele em setembro – o controverso Eric Adams inicialmente terá de focar sobre a criminalidade, diz o jornal.
Durante a campanha ele exaltou a primazia na defesa da “ordem e da lei”, mas também apoia a reformulação da polícia – bandeira cara aos nova-iorquinos, reforçada nas manifestações ano passado depois do assassinato de George Floyd.
Como irá equilibrar isso, ele que por 22 anos pertenceu ao NYPD, será algo complicado. Como negro, Mr. Adams sabe que as comunidades negras anseiam por ruas mais seguras e uma polícia mais confiável. Se tiver sucesso nesse campo, será um triunfo.
Terá de enfrentar o déficit educacional em mais de 1 milhão de escolas públicas municipais, nas quais em torno de 600.000 estudantes foram forçados pela pandemia a atividades totalmente remotas no último ano. 100.000 desses estudantes são de famílias sem-teto, numa cidade que ostenta alto índice de segregacionismo escolar.
Estão pela frente problemas econômicos e sociais. A exemplo da escassez de oferta de moradia para a maioria dos trabalhadores, do recrudescimento da violência e da criminalidade – incluindo o de alguns dos presídios perigosos administrados pelo município.
O sistema de metrô (subway) está deficitário, em crise com a pandemia por diminuição de passageiros. Na política, entretanto, terá o apoio da governadora do Estado, do mesmo partido, que assumiu em substituição à recente renúncia de Andrew Cuomo, acusado de assédio.
Para ser eleita nas eleições estaduais ano que vem, Kathleen Hochul não pode abrir mão do apoio de Adams. Isso beneficiará sua administração, ao contrário da de De Blasio, que desgastou a cidade devido à competitiva briga com o ex-governador.
- “NINGUÉM SABE QUEM É”
The New York Times traçou o perfil do futuro prefeito na edição de domingo 24/10, com título de capa “Quem é Eric Adams? Ninguém sabe, mas ele é provavelmente um vencedor”. Os quatro jornalistas que assinaram a matéria entrevistaram nada menos que 130 pessoas para fazer o perfil, crítico.
Negro nascido no Queens, na área chamada South Jamaica, há tempos trabalha sua candidatura a prefeito de forma obstinada. Buscou conselhos e alianças de todos os tipos.
Um antigo conselheiro de David Dinkins lhe recomendou 4 passos, ainda quando policial, para ser competitivo à prefeitura: 1) ganhe um diploma universitário; 2) ascenda na carreira na corporação policial; 3) vença eleições em cargo representativo para atuar em Albany (a capital política do Estado de Nova York) e 4) ganhe a disputa para presidir um dos cinco boroughs da cidade de Nova York.
Adams seguiu o conselho. Aposentou-se como capitão, cursou e ganhou um diploma qualquer numa faculdade, elegeu-se em 2007 Senador estadual por Nova York em Albany e foi eleito presidente do boroughs Brooklyn.
Explique-se: a cidade de Nova York tem cinco subcidades, chamadas boroughs: além do Brookyn, Manhattan (o mais cobiçado), Queens, The Bronx e Staten Island.
Cada um desses boroughs elege pelo voto de seus eleitores cadastrados seu “presidente”, que atua como prefeito em sua jurisdição. Contudo, o prefeito de New York City é eleito para comandar toda a cidade, com o voto dos eleitores de todos os cinco boroughs.
Nessa trajetória, trocou de partido (era Republicano), aliou-se a magnatas do dinheiro e da mídia. Em Albany atuou de forma politicamente profissional, não abandonando amigos e colegas que caíam em desgraça por acusações de mal feitos – seja corrupção, seja assédios.
Por recompensa, esses agora estão com ele, que almoça em altos círculos exclusivos de amigos mesmo de Donald Trump, Rupert Murdoch (magnata da mídia), gente bilionária de Wall Street como Mike Bloomberg, prefeito republicano de 2002 a 2013, anterior a De Blasio. Arrecadou tanto dinheiro privado dessa gente para sua campanha que decidiu abrir mão de fundos eleitorais públicos na corrida à prefeitura.
- O PRIMEIRO NEGRO PREFEITO
David Dinkins(1927-2020), também Democrata, foi o primeiro negro que governou a metrópole, de 1990 a 1993. À época a cidade era uma das mais perigosas, sujas e violentas, e continuou sendo em seu mandato. Mesmo reconhecido por sua visão humanista no trato de direitos humanos, foi rejeitado pelos eleitores.
O sucessor de Dinkins, o Republicano direitista Rudolph Giuliani, hoje o advogado pessoal de Donald Trump, foi quem consertou o estrago, inclusive espalhando iluminação pública nos sombrios desvãos.
Com sua política de “tolerância zero”, de linha dura, armou o Departamento de Polícia, justamente na época em que Eric Adams atuava (então filiado ao Partido Republicano), orientando a repressão e as abordagens de “suspeitos” (leia-se negros e latinos). A gritaria, a reação irada de liberais, “esquerdistas” bem-nascidos e sindicalistas foi geral no seu mandato.

Qualquer tipo de delinquência passou a ser punida com extremo rigor. Por exemplo, mijar em áreas públicas, pular catraca do metrô para não pagar a passagem, pichações, vandalismo. Tudo dava cadeia e julgamento que seguiam condenações com penas pesadíssimas.
Estrangulou ou limitou a atuação de gangues que infestavam, como os ratos ainda hoje, a cidade. Fez uma “limpeza” segregacionista, banindo a prostituição escancarada e seus intermediários.
Atraiu capital de investimento imobiliário, com sua política de gentlificação que tornou praticamente impossível – a menos que sua renda anual seja acima de 200 mil dólares, e olhe lá! – residir em áreas aprazíveis da cidade.
Empurrou os pobres, migrantes, negros e o “with trash” lá para as fronteiras geográficas que são verdadeiras zona de guerra e de vale-tudo. Hoje, mesmo o Harlem em Manhattan, uma vez conhecido pela forte presença física e cultural de negros, está gentlificado.
Em quatro anos a cidade já era outra. Com a economia e o mercado bombando, inclusive nos setores culturais, de turismo, de restaurantes, de hotéis, de artes, shows, televisão. Talvez até por conta de, no período, a economia dos Estados Unidos sob a presidência de Bill Clinton, ter ido bem, beneficiando o linha dura.
Fato é que Giuliani foi reeleito – claro que com votos da maioria dos eleitores democratas e liberais da cidade –, tendo restado no posto de 1994 a 2001, ano dos ataques da Al Qaeda às Torres Gêmeas do World Trade Center.
Em país clivado permanentemente pela tensão racial, com ideário de supremacia branca (assim mesmo elegeu Barack Obama), no qual afloram a brutalidade policial e a violência da criminalidade, Eric Adams será escrutinado de perto por todos.
Artigo muito informativo e com uma preciosa análise do cenário político norte-americano por alguem familiarizado com o dia a dia do país!
Grato, Fernando. Sou, também, fã de NY. Abraço, Luis Guilherme
Fernando Conceição: I does’t seem that it was easy to win! Não parece q foi fácil vencer as eleições para prefeito de Nova Iorque. Afinal, como vc mesmo disse “foram anos de ação” tocada em chegar a este lugar. Por que vc diz q será mais difícil administrar a cidade????
Um abraço.