
Pelas estatísticas do IBGE, devo viver ainda mais vinte anos.
Muito chão pela frente.
Vinte anos, parceiro(a), é a idade média de 80% dos jovens assassinados no Brasil, entre os cerca de 60 mil assassinatos/ano. Como enfatiza o poeta Hamilton Borges Walê, militante da campanha Reaja ou Será Morta(o).
Se fosse mulher, na Bahia, onde mulher vive quase 10 anos mais (IBGE), teria maior vantagem.
Como homem, negro, oriundo de favela, há tempos estou na conta dos sobreviventes.
Favelados e negros são, os homens, as categorias mais vulneráveis a mortes “por causas externas”.
Leia-se vítimas de homicídios, da violência policial, choques, traumatismos, suicídios, AVCs.
Já dobrei o Cabo-da-Boa-Esperança.
No momento em que escrevo essas mal traçadas estou inteirinho da silva. Ainda.
Superadas ameaças. Prisões nos estertores da ditadura. Ataques morais. Pressões. Ciúmes irracionais. Chantagens de toda natura.
De poderosos empresários e ex-prefeitos, como Mário Kertèsz, a gentes medíocres entranhadas em estruturas institucionais totêmicas, como USP e onde hoje presto serviço.
Firme, forte, seguindo em frente.
Salvo por uma lombalgia que quase me aleija há duas semanas.
E um ultrassom que mostra um grãozinho de areia nos rins: nada que um chá de Quebra-pedra não dê jeito.
O urologista fez-me ontem exame de toque, descartando más notícias.
Tudo o mais que vier desde a partir de ant’ontem agora é lucro. “A questão é só de dar/ A questão é só de dor” (Vinicius de Moraes, “Pra que chorar“).
Acabo de educadamente recusar a oferta de presidir no Estado um partido político que fará cem anos daqui a dois. Apesar da sedução quase convincente do emissário, tenho planos mais arejados.

Nas duas décadas que restam-me neste curiosíssimo planeta, não sendo um Roberto Marinho que desse ponto em diante montou o império Rede Globo;
Tampouco sendo um José Saramago, estreante a essa idade na literatura reconhecida que lhe traria um Nobel e uma Pilar del Rio…
… restam-me projetos muito mais modestos, apesar de ambiciosos.
Pela ordem: disputar e vencer em 2022 a Reitoria da Universidade Federal da Bahia. Faria bem a meu ego leonino. Tornar-me o primeiro negro reitor qualificado dessa – vade retro Satana! – vetusta instituição acadêmica.
Oportunizar à filha responsável por minha atual sanidade a chance de experimentar outras relações culturais.
Pretendo que esse ser de 7 anos acompanhe-me em período de pós-doutorado previsto para Nova York, Estados Unidos, assim que a imunização contra a pandemia da Covid-19 permitir.
Não tenho tempo a perder, martela na cachola o rock da Legião Urbana.
Beber bons vinhos, ler bons livros, curtir viagens e mais viagens.
Rir pra caralho: de mim mesmo, dos erros e enganos da vida.
Manter a serenidade mas continuar arrombando portas a ponta-pés.
O virílico Exu que vige aqui dentro impede-me prosseguir com digressões da libido, o safado!
Em frente!
Em momento algum me escapa a consciência do grande privilégio que é ser sua orientanda. Que eu possa ser uma boa moringa, daquelas que em qualquer feira não se acha – vêm com asas acopladas pra todo canto carregam águas.
Longa vida ao pensador, à sua verve e ao Exú que com outras forças ancestrais lhe habita!
Te amo!!!!!