
PASSO AS primeiras duas semanas de novembro nos Estados Unidos da América.
Devo debater com pares de universidades da Florida (Miami e Tampa), New York e Massachusetts (Boston) compreensões acadêmicas comparativas na busca da contenção dos escandalosos índices de violência no Brasil.
Estados Unidos e países europeus, guardadas as devidas proporções aritméticas e históricas, já passaram por isso que aqui os brasileiros vivenciamos há décadas.
É bom trocar e aprender com ensinamentos de quem conhece o assunto.
Foi assim que, recentemente, passei uma tarde inteira discutindo a questão com dezenas de oficiais, sub-oficiais, sargentos e soldados da Polícia Militar do Estado da Bahia.
A convite da Sub-Tenente PM Lílian Cerqueira, que já foi minha aluna especial de Pós-Graduação, palestrei para a turma de militares no Curso de Comunicação Social e Media Training, sob os auspícios do Departamento de Comunicação da Polícia Militar.
Naquela manhã havia participado de banca examinadora de tese de doutorado na Universidade Católica de Salvador, intitulada “Corpos enforcados, destroçados e desaparecidos: violência contra jovens negros em Salvador“, autoria de Andaraí Ramos Cavalcante.

Saí da banca diretamente para o auditório do complexo da PM do outro lado da cidade, transportado por motorista à paisano em carro sem identificação sob as honras do Capitão PM Fausto, responsável pelo curso.
Foi uma tarde produtiva. Atentos, os militares escutaram as posições críticas deste palestrante sobre a estrutura do Estado e da sociedade brasileiros – fundada na violência da colonização escravista.
E a decorrência disso no modus operandi da Polícia, braço armado do Estado, em combinação com a leniência da legislação criminal e do poder judiciário em investigar e punir criminosos.
O desafio é que falasse sobre relações entre violência, Comunicação e Poder – matéria do domínio deste escrevinhador.
Desde o início de 2018 sou parte do corpo docente da graduação em Tecnologia de Segurança Pública, da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia.

Com turmas espalhadas fora de Salvador, em polos de regiões como Juazeiro, Vitória da Conquista, Itabuna, Camaçari. Para onde vamos debater a temática disciplinar.
A maioria dos alunos, profissionais que já atuam ou querem atuar nos aparatos de segurança e repressão ao crime.
No contexto de uma sociedade profundamente desigual, de estratos e classes sociais em conflito, a Polícia é uma instituição necessária mas agentes policiais são vistos por arbitrários.
Se no confronto, a polícia brasileira é das que mais matam no mundo, também seus agentes postos em zonas de conflito são os que mais morrem em comparação com similares de democracias modernas.
Quanto esse fenômeno tensiona e prejudica a democracia que a partir da Constituição de 1988 o Brasil quer construir, este é o problema fundamental.
Disse ao grupo de policiais, homens e mulheres, que me ouviam atentos. Lá de cima, os donos do poder não descem para o confronto. Mandam vocês.

No contexto brasileiro, a maioria dos que tombam – média de 60.000 pessoas/ano – é negra. De um lado ou de outro da casamata.
A elite de poder, aí incluídos governantes e chefes dos três poderes da República, fingem agir.
Como quem estão se matando são os pretos, fardados ou em camisetas vagabundas, os de cima lavam as mãos para a tragédia do andar de baixo.
Muito bom, Professor. Consciência é estar onde somos necessários.
Fiz esse curso ano passado, é um bom aprendizado.