Robert Kurz (1943-2012), no seu artigo “Cultura degradada” – de como o totalitarismo do mercado destrói seus próprios fundamentos intelectuais – é um dos autores obrigatórios que utilizo nos cursos que ministro a estudantes de graduação e de pós-graduação.
Vem a calhar quando submetemos a uma análise crítica projetos de investimentos no campo da cultura como os da Braskem – um dos braços da indústria petroquímica da multinacional empreiteira Odebrecht.
Uma de suas ações de marketing mais vigorosas é o “Fronteiras Braskem do Pensamento”, que anualmente “oferta” a um público supostamente ilustrado palestrantes galhardoados de fama ou subfama internacional.
Como a base de operação da Braskem é o Polo Petroquímico de Camaçari, a menos de cem quilômetros de Salvador, há tempos o mundinho das artes da Bahia – com destaque para as artes teatrais – alimenta-se das migalhas da Braskem.
O “Fronteiras do Pensamento”, por exemplo, acaba de trazer a Salvador duas mulheres de sua edição 2019:
Lilia Schawarcz, herdeira de uma das mais produtivas empresas do ramo editorial, e Djamila Ribeiro, moça de bons modos que, de uns tempos para cá, passou a ser aceita no círculo do show business do entretenimento cultural.
Supostamente essa gente tem algo novo a dizer à plateia de convertidos.
Nessa quadra da história da sociedade brasileira, quando os espíritos perderam a capacidade de operar uma distinção objetiva entre aparência e essência, Kurz é necessário.
Os que produzem cultura no Brasil se renderam sem um grunhido sequer à lógica capitalista do mercado de bens simbólicos.
Mais constrangedor é assistir à completa submissão dos… (vamos dizer para melhor entendimento)… intelectuais.
No passado os intelectuais tinham por obrigação profissional denunciar o modelo hegemônico. Depois da queda do muro de Berlin, atônitos, perderam completamente valores éticos universais.
Um desses valores é a busca da verdade para, ao encontrá-la, difundi-la em linguagem acessível ao maior número das pessoas.

O relativismo cultural, essa armadilha da chamada pós-modernidade, dita serem legítimas todas as verdades – excluindo totalmente a realidade do mundo físico-químico-biológico no qual nos arrastamos até a morte. Esta, por exemplo, contraria totalmente os relativistas.
Ou seja, como a morte é certa, ela é uma verdade mais verdadeira do que outras. Dessa forma, vê-se ser uma falácia o relativismo.
A verdade verdadeira é ser a Braskem uma das contumazes empresas que desviam dinheiro público do orçamento do Estado, para se locupletar.
O esquema da Braskem está comprovado na Operação Lava Jato.
Dinheiro que deveria ser investido em educação, cultura, segurança pública, saúde, pesquisa, agentes públicos em cargos de governo desviaram para seus bolsos. Em forma de propina paga pela empresa visando obter maiores benefícios empresariais e lucratividade.
Depois de as investigações da Operação Lava Jato comprovarem os desvios, dirigentes da empresa foram julgados e condenados.
Por sua vez a Braskem teve de fazer um acordo com o Judiciário, que implica na devolução de parte do dinheiro roubado dos cidadãos brasileiros.
Apenas à Petrobras a Braskem devolveu, até agosto último, mais de R$ 564 milhões ( US$ 150.000.000), a título de multa.
A sociedade tem de estar vigilante, pois práticas empresariais deletérias ao interesse público fazem parte da natureza do capitalismo no Brasil.
O que significa dizer: lucro e mais valia são a ética que orienta o capitalista.
Quanto pseudointelectuais e o povo da cultura, há muito esses abandonaram princípios éticos que os conectavam aos anseios das multidões submetidas.
O que querem é aparecer, dar palestras, vender livros, ganhar prêmios e troféus.