Fosse hoje, sob as garras do plenipotenciário Alexandre de Moraes, que é quem manda e desmanda no Brasil, este escrevinhador estaria fodido e mal pago!

O cenário, o parlamento soteropolitano. A primeira Câmara Municipal legislativa do país, dos tempos de Tomé de Souza, primeiro governador geral da colônia portuguesa nos trópicos – patrimônio histórico brasileiro.

Era o fim da transição política do regime militar de 1964, com o arranjo das elites que resultou na devolução do comando da República aos civis.

Uma centena de favelados de diversos locais que para ali se dirigiram durante a tarde, assistia as manobras dos “representantes do povo”, seus discursos enfadonhos, sua prosopopeia de galinheiro.

Em jogo uma transação milionária arquitetada pelo então prefeito de Salvador. Em benefício de seus próprios interesses gananciosos, de empreiteiras que depois se soube lhe enchiam a burra, e dos seus aliados, inclusive à frente de jornais.

O lubridria naturae fechou negócio para retirar centenas e centenas de moradores favelados de uma área nobre da cidade – no caso, a região do Stiep, Pituba, Costa Azul (defronte para o mar do Jardim de Alá).

Dispersá-los, realocando-os em zonas profundas, e, por permuta, entregar a nobre área imobiliária a uma “benfeitora” escolhida a dedo.

Ante o protesto dos favelados, em apoio aos moradores daquela zona também presentes, uma juíza concedera naquela tarde uma liminar ordenando a suspensão da votação, a toque de caixa, do projeto emanado do chefe do poder executivo. Até melhor avaliação.

O oficial de justiça dirigiu-se ao teatro para entregar a ordem judicial a quem de direito. Um a um, o destinatário principal e os subsequentes buscaram driblar o servidor da justiça, escondendo-se daqui para ali.

De seu gabinete ou sei lá de onde, Mário Kertèsz, o principal interessado na causa de execução da fatura, como um capo siciliano pressionava os eleitos da sua gangue.

Lá para as tantas o presidente e os membros da mesa da Câmara Municipal de Salvador decidiram: “Foda-se!” a liminar da juíza Therezinha Maria Lopes, da 7ª Vara da Fazenda Pública!

À toda a chacota, entregues a si mesmas, aquelas centenas de pessoas assistiam.

Os que hoje se jactam de “defensores da democracia” e coisas que tais – governistas ou oposição – sempre estiveram no seu bem-bom, ou no mais ou menos bom de sua vulgaridade.

Homens, mulheres, algumas grávidas, crianças, jovens, idosas vindos com dificuldades de longe, se viam provocados. Não apenas pelo cinismo e gozações que os edis atiçavam na cara daquela gente. Aguerrida, ainda que má-nutrida.

Exausta, sem alimentar-se, com escassez de água, a pequena multidão foi levada ao cansaço e à frustração. Era preciso quebrar-lhe a força, a dignidade de pessoa humana, humilhar aquela gente.

Nisso são craques, verdadeiros Maradonas, os “representantes eleitos do povo” nas Câmaras Legislativas Brasil afora e adentro. Brasília: o palco principal de suas estripulias e de suas perversidades corporativas.

Que nesse momento falem em uníssono, com a mesma cantilena monocórdia, os chefes dos chamados “três poderes” da República Federativa do Brasil.

Já ia dar 9 da noite quando, num átimo, o Quem de Direito pôs em votação a negociata. “Quem vota a favor, permaneça como está!”

“- APROVADO!”

Foram menos de dez minutos para sacralizar a merdocracia de que são ases.

Da apertada galeria, os manifestantes reagiam como era mister a sujeitos que sabem construir a história labutando com suas próprias mãos, sem senhores acima de suas cabeças.

E atiçaram moedas em cima dos traidores investidos do poder de destruir vidas e comunidades.

Por reação, um desses energúmenos que expõem broches metalizados brilhantes, insígnias de parlamentar sobre o peito do terno, ele próprio, arrancou uma coluna de madeira do cercado que separa o povo popular e eles do plenário. Com o porrete, tentou atingir uma favelada que protestava.

Foi a senha para que os homens da segurança da Câmara, em trajes civis ou em farda militar, armados com revólveres e soqueiras de aço nos punhos, orquestrassem o massacre sobre o povo desarmado que se manifestava.

Bom… viemos aqui para lutar ou se acovardar? Resultado: sangreira e fuga enlouquecida do lado de cá!

Completaram o resto do trabalho sujo alguns pulhas jornalistas e editores de jornais, dias seguintes. Naquele tempo, como agora, tudo gente de fino trato, bacaninha, “porretinha”…

As chamadas instituições, tipo OAB, ABI, Universidade, personalidades e entidades do “campo da cultura”, pfiu!.

Os “intelectuais”?… Hummmm…

Peraí que vou ali dar um mijão!…