
O palanque diário, com cobertura de toda a grande mídia desde a primeira semana de março, deve ter influenciado a postura confrontativa do agora ex-Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, em relação a quem o nomeou e agora o demite, presidente da República Jair Bolsonaro.
Registre-se: gira em torno de 55% até agora a taxa de pessoas recuperadas depois de contaminadas no Brasil. Um índice nada desprezível.
No 16 de abril da demissão de Mandetta, a letalidade da Covid-19 estava em 6,3%, com 1.924 mortos dos então 30.425 casos confirmados até o final da tarde, informava oficialmente o Ministério da Saúde. Isso significava 32 mortes por 1 milhão de habitantes.
Por volta das 10h da manhã de 17 de abril o World-o-meters, banco de dados em tempo real, mostrava 30.891 casos (mais 208 novos em 24 horas) e 1.952 mortos.
Os dados estão mascarados por conta do baixíssimo número de testes aplicados até agora: apenas 296 de pessoas entre 1 milhão.
Na Alemanha estavam testados 20.629, nos Estados Unidos 10.263 (quase o mesmo na Coreia do Sul), na Itália e na Espanha mais de 19.400, Israel superava 23.000, similar à Suíça, e Portugal mais de 20.000 pessoas testadas por 1 milhão.

Desde a confirmação da presença do vírus no Brasil ficou explicitada a divergência entre o chefe e o subalterno.
Divergência explorada à exaustão, a cada minuto, por setores midiáticos de linha editorial antibolsonarista, como o complexo Rede Globo de TVs abertas e fechadas, e jornais como Folha de S. Paulo.
Esses setores ungiram Mandetta à posição de herói nacional. Ele gostou do novo papel.
Cavou, assim, sua exoneração do cargo.
Isto ficou evidenciado no domingo anterior à demissão ocorrida na quinta-feira seguinte à exclusiva e incensada entrevista concedida pelo ministro ao programa “Fantástico”, da referida Rede Globo.
Teve ego e vaidade embalados pela oposição bolsonarista. Que, à falta de gente sua (grande parte às voltas com a Polícia Federal), desde a derrota de outubro de 2018 anda desesperada à busca de um ídolo qualquer ao qual se agarrar.
Aí está o que derrubou Mandetta.

De repente um ministro da cota do DEM, partido de centro-direita, tornou-se referência de bom mocismo, em contraste com o “brucutu” que o nomeou para a função.
Político profissional, ex-deputado federal recomendado ao posto pelo aliado bolsonarista de primeira hora, Ronaldo Caiado, governador de Goiás, Mandetta agiu calculadamente.
Não à-toa sua entrevista ao “Fantástico” foi concedida desde a sede do governo goiano, com elogios rasgados à Globo.
Os holofotes estimularam Mandetta a posicionar-se em termos de que ou a sociedade obedece ao ministro ou obedece ao presidente da República.
Evidente quebra de hierarquia e falta de humildade.
Qual chefe de Estado, ontem ou hoje, aqui ou alhures, já permitiu um subalterno falar mais grosso do que quem assinou sua nomeação?
Nada esteve improvisado. O governador Caiado (DEM), declarara rompimento com Bolsonaro depois do desastroso pronunciamento deste, a 25 de março, repudiando “a histeria” em relação a “uma gripezinha” como esse vírus.
Os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, ambos do mesmo partido de Mandetta, evidentemente colocam combustível no confronto.
O DEM, nacionalmente presidido pelo prefeito de Salvador, ACM Neto, quer construir uma alternativa de poder para 2022. Ou negociar maior espaço.
É fato: Bolsonaro alinha-se com os chefes de Estado mundo afora, a exemplo de Donald Trump dos Estados Unidos da América, que negam recomendações de isolamento social radical da W.H.O. (OMS – Organização Mundial da Saúde) como método de minimizar efeitos devastadores, em termos de letalidade, pela pandemia da Covid-19.

Com o primeiro caso a 8 de dezembro de 2019 admitido pela China, a 17 de abril este novo coronavírus havia matado em torno de 148.000 pessoas em todo o mundo, tendo infectado mais de 2 milhões e 198 mil, de acordo com o World-o-meters.
O oncologista Nelson Teich, que assume o Ministério da Saúde neste 17 de abril, tem referencial e já assessora Bolsonaro desde a campanha que o elegeu presidente.
Em seu primeiro pronunciamento como novo ministro da Saúde, ao lado do chefe, Teich falou que há incertezas no cenário e confusão de números.
Verdade: o Ministério da Saúde precisa ser mais assertivo no que informa, mais transparente.
Nenhum país, nenhuma sociedade, nenhum indivíduo pode ser condenado a uma quarentena eterna.
Não é aceitável a 8ª economia do mundo não delinear uma estratégia científica de retorno, mesmo que paulatino, à normalidade social.
Para isso, ele mesmo admite, há de tentar massificar a testagem. O aumento exponencial de casos positivos, isolamento e mortes dar-se-á, então.
Até que, como já estão fazendo outros países, as coisas recomecem – tomando-se os cuidados necessários de proteção à vida das pessoas.
Muito bom o texto. Vai ao encontro do que penso.
Bem sensato
Para além do fisiologismo partidário que orientou o posicionamento político adotado pelos presidentes da Câmara e do Senado em relação às trocas de farpas entre o Presidente da República e seu Ministro da Saúde, há de se reconhecer que o ego de Bolsonaro não tolera que nenhum de seus subordinados se sobressaia e tenha mais destaque e popularidade do que ele mesmo. Haja vista as recorrentes “rusgas/rugas” entre ele e o Ministro da Justiça Sergio Moro, poucos meses antes da disseminação do coronavírus no Brasil.
Bolsonaro sabe que a sua reeleição depende da conjuntura econômica do país, e por isso tem repudiado com veemência as medidas de isolamento social que vem sendo adotadas por prefeitos e governadores. À semelhança do que fez Donald Trump nos EUA, ele tem apostado em um perigoso discurso de conclamação ao retorno das atividades econômicas, a despeito do crescimento da disseminação da doença pelos bolsões de pobreza do território nacional.
Provavelmente, em seu cálculo político, a preservação de algumas vidas pobres não vale o preço do enfrentamento de uma grave recessão econômica de proporções mundiais.
Importante reflexão. Mas não pude entender penúltimo parágrafo. ‘